Postado em: 1 setembro, 2023

Instituto Casa das Pretas recebe evento para apresentar dados da pesquisa “Percepções do racismo no Brasil”

Durante o encontro, promovido pelo Projeto SETA, participantes debateram como o racismo acontece nas instituições de ensino

Na noite do dia 31 de agosto, o Instituto Casa das Pretas, localizado na Lapa, recebeu o evento de lançamento da pesquisa “Percepções do Racismo no Brasil”. O encontro reuniu representantes de diferentes movimentos sociais para expor as descobertas realizadas através do estudo e, também, debater como a educação pode mudar o entendimento social sobre o racismo.

A representatividade da escolha do local, onde Marielle Franco cumpriu a sua última agenda oficial, foi destacada na apresentação dos resultados da pesquisa, que ficaram a cargo de Luciana Ribeiro, especialista em educação do Projeto SETA.

Entre as descobertas analisadas durante o encontro, a especialista destacou dados que apontam o racismo no ambiente escolar e como a percepção se distribui a partir de gêneros. O levantamento constatou que 38% dos entrevistados afirmam já terem sofrido racismo na escola, onde 64% das pessoas possuem idade entre 16 e 24 anos. Esses resultados concordam com o fato de 69% dos respondentes considerarem a temática como uma das mais importantes a serem abordadas em sala de aula.

A mesa de conversa, mediada por Dandara Oliveira, especialista em articulação e projetos do SETA, abordou como os números obtidos pela pesquisa transparecem no dia a dia de pessoas pretas. Ligia Batista, Diretora Executiva do Instituto Marielle Franco, Larissa Amorim, Diretora Executiva da Casa Fluminense e Edmeire Exaltação e Ana Beatriz, co-fundadoras da Casa das Pretas, além de comporem a mesa de conversa, deram as boas vindas aos convidados e ao Projeto SETA.

Para Ligia Batista, os resultados são capazes de colaborar com a construção de um debate coletivo assertivo e, assim, gerar impactos relevantes. “Falamos do racismo estrutural, mas, quando abordamos a estrutura percebemos a falta de compreensão da sua complexidade. Então, tratar sobre o assunto tem muito a ver com a importância da educação antirracista. Afinal, precisamos compreender quais são os impactos que a ausência de efetiva implementação de políticas públicas na educação básica causa na sociedade”.

Na visão da diretora, ainda não há um entendimento da sociedade sobre o que é o racismo estrutural, especialmente, enquanto as pessoas ainda analisam qual significado de tal construção em suas realidades.

Sobre políticas públicas
Para a Diretora Executiva da Casa Fluminense, Larissa Amorim, os dados obtidos com a pesquisa evidenciam um problema: a falta de representatividade em bases públicas. “Temos uma dificuldade grave nas bases públicas de dados do país. Para entender melhor essas percepções, existe uma série de lacunas, uma vez que boa parte dos dados que acessamos ignora o recorte que envolve o debate étnico-racial”. Ela completa ao analisar que a falta de informações facilita uma construção social de que o racismo é algo distante, o que pode se tornar oportuno.

Para explicar a importância desse recorte, Larissa Amorim trouxe um dado sobre atropelamentos ferroviários na região metropolitana do Rio de Janeiro. Segundo ela, 78% dos acidentados são negros, evidenciando quem são as pessoas que mais se arriscam ao passar pelos trilhos. Dessa forma, é possível entender o contexto social, político e econômico por trás dos números.

Dados destacam falta de evolução na discussão racial no Brasil
Assim como as demais convidadas, Edmeire Exaltação apontou como fundamental os dados obtidos através da pesquisa e destacou como o estudo expõe um retrocesso na discussão racial entre os brasileiros e brasileiras. “Fico triste com a sociedade brasileira ao perceber o quanto o nosso racismo é inteligente, persistente e, também, como a população caminha pouco na sua percepção racial”, comentou.

A co-fundadora da Casa das Pretas pontuou que a pesquisa realizada pelo Projeto SETA evidencia que a população sabe da existência do racismo no Brasil. Isso, no entanto, muda quando as pessoas são colocadas em uma observação mais pessoal e individual do tema. “É um resultado muito eficiente para o racismo, para a maquinaria racista da comunidade porque expõe que o racismo vence. O Brasil é um dos países que mais lucra com o racismo”.

Edmeire ponderou: “No Brasil, há um grupo populacional dominante que lucra com essa situação. Não é à toa que temos uma das maiores desigualdades do mundo, e ela vem alimentada pelo racismo estrutural”. Para ela, a divisão racial inicia logo nos primeiros anos de educação, quando crianças passam a vivenciar uma estrutura social longe de suas famílias. “Começa na escola com a prática de classificar, categorizar, ou marcar quem é superior e quem é inferior. E os professores são os primeiros a passar essa questão para os alunos”, comentou.

A educação é fundamental para transformação social
Durante o debate, Luciana Ribeiro reforçou que a mudança precisa ser a partir da educação, onde diversos temas podem – e devem – ser abordados. “Como vamos explicar e fazer as pessoas sairem do campo da percepção para construírem outras compreensões sobre o racismo, se não olhamos a educação como precisamos?”, refletiu a especialista em Educação do Projeto SETA.

Os momentos finais do encontro foram destinados para as colocações do público. Para Janete Santos Ribeiro, da audiência, a pesquisa a ajuda como professora da educação básica: “Estamos sempre procurando respaldar o que fazemos no espaço escolar. Esse estudo nos ajuda nessa questão e mostra o que ainda precisamos trazer para os enfrentamentos no cotidiano”.

Já o jornalista Wendell Cristiano enxerga os resultados como um bom suporte para o entendimento dos problemas raciais da sociedade brasileira. “É importante para análises, pesquisas e para a construção de políticas públicas mais assertivas. É, também, essencial para conhecermos a realidade da população negra e o que esse grupo pensa. Assim, é possível elaborar mais iniciativas e ações voltadas para o tema”, destacou o jornalista.

O sumário executivo com os dados do estudo “Percepções do racismo no Brasil” está disponível através do link: https://percepcaosobreracismo.org.br/.

O encontro, realizado no Instituto Casa das Pretas, foi o terceiro promovido pelas instituições responsáveis pela pesquisa “Percepções do Racismo no Brasil”.

No mês de agosto, o Geledés – Instituto da Mulher Negra, localizado no Centro de São Paulo, recebeu representantes de instituições, como: Ação Educativa, Associação Museu AfroBrasil, Canal Futura, Perifa Connection e Instituto Unibanco.

No Auditório da Editora Globo, no Rio de Janeiro, com apoio da Fundação Roberto Marinho, houve um encontro focado em discutir os dados sobre educação divulgados no estudo. Na ocasião, representantes do Museu de Arte do Rio, Prefeitura do Rio de Janeiro, Museu de Arte Moderna, profissionais da rede municipal de ensino e membros de entidades do terceiro setor participaram do evento.

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O racismo estrutural no Brasil tem dificultado, de forma sistêmica, o acesso ao direito a uma educação pública igualitária e de qualidade pelos estudantes negros, quilombolas e indígenas. A qualidade da educação que as crianças recebem no Brasil é profundamente segmentada por status racial e socioeconômico. E, hoje, identifica-se que as lacunas entre crianças brancas e crianças negras, quilombolas e indígenas, em todos os indicadores da educação básica, são persistentes e mais graves para jovens de 11 a 17 anos. Crianças e jovens negros, quilombolas e indígenas são os mais propensos a abandonar a escola, têm maiores taxas de exclusão e menor nível educacional. Portanto, a eles são destinados os empregos de menor prestígio e salários mais baixos quando adultos. Enquanto isso, os alunos brancos internalizam as desigualdades raciais a que são expostos nas escolas e as replicam quando adultos. Quando se observa os indicadores de aprendizagem, conclui-se também que não há apenas mais barreiras de acesso à escola para crianças negras, quilombolas e indígenas, mas, que uma vez na escola, essas crianças são menos propensas a acessar à educação de qualidade.

O Projeto SETA busca realizar ações transformadoras com base em evidências resultantes de estudos que ajudam a compreender a complexidade das relações raciais no país e as problemáticas delas decorrentes que precisam ser enfrentadas. Neste sentido, prevê uma série de estudos com recortes nacional e regionais em seus territórios de intervenção, especialmente no Amazonas, Maranhão, Rio de Janeiro e São Paulo. O objetivo é mapear a percepção da sociedade em geral, de profissionais da educação e estudantes sobre o racismo, as desigualdades raciais em geral e na educação, a efetividade das políticas de combate ao racismo, as lacunas de ferramentas e metodologias para fomento à equidade racial e as estratégicas bem-sucedidas e boas práticas nacionais e internacionais que podem inspirar ações de valorização da diversidade e das diferenças e de mitigação das desigualdades, especialmente na área de educação.

1) Pesquisa bianual de mapeamento de público sobre percepções do racismo pela sociedade brasileira.
2) Grupos focais bianuais sobre percepções do racismo pelas comunidades escolares.
3) Monitoramento e avaliação dos indicadores educacionais com análise dos indicadores da educação com foco em raça, gênero e território.
4) Estudos liderados pelas organizações que compõem o Projeto SETA sobre “educação escolar indígena”, “educação escolar quilombola”, “trajetória educacional de meninas negras”, “juventude negra, educação e violência”, “impacto da reforma do ensino médio no aprofundamento das desigualdades educacionais” e “construção participativa de indicadores e diagnóstico sobre qualidade na educação e relações raciais”.
Todas essas produções são/serão disponibilizadas publicamente para auxiliar a sociedade na construção de narrativas qualificadas, com base no retrato da realidade, em defesa da equidade racial na educação, além de orientar ações do projeto.

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O PROJETO SETA – SISTEMA DE EDUCAÇÃO PARA UMA TRANSFORMAÇÃO ANTIRRACISTA É UM PROJETO APOIADO PELA FUNDAÇÃO W. K. KELLOGG, DESDE 2021, QUE REÚNE ORGANIZAÇÕES NACIONAIS E INTERNACIONAIS EM ATUAÇÃO CONJUNTA POR UMA EDUCAÇÃO PÚBLICA ANTIRRACISTA E DE QUALIDADE.