Postado em: 23 janeiro, 2025

Resultados da redação do ENEM 2024 reforçam a importância da implementação efetiva da Lei 10.639/2003

Imagens dos cadernos da prova e redação do ENEM

Em todo o país, apenas uma aluna de escola pública conquistou nota máxima na redação (Foto: Agência O Globo)

O Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) é a principal porta de entrada para as Universidades públicas e privadas do País. A redação exigida na avaliação é um dos pontos mais relevantes e, em alguns casos, determinante para a conquista da tão sonhada vaga no Ensino Superior.

A última edição teve como tema de redação “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”. De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), dos mais de 3 milhões de participantes, somente 12 tiraram a nota máxima. Desses, apenas uma aluna é de escola pública. O número de notas máximas é o menor dos últimos dez anos.

Para Ana Paula Brandão, Gestora do Projeto SETA, a desigualdade é uma das explicações para a ausência de alunos de escolas públicas em listas como as de notas máximas na redação. “Não estamos falando de capacidade, mas, sim de orçamento, de planejamento e de vontade política. Os estados precisam investir mais na formação continuada de seus professores, na construção de um plano político pedagógico mais dialogado com sua comunidade escolar, no desenvolvimento de uma cultura escolar inclusiva, participativa e democrática”, comenta. 

De acordo com Luciana Ribeiro, Especialista em Educação do SETA, os resultados, do ponto de vista do campo da educação, fazem parte de um conjunto de ações sistêmicas que contribuem na qualidade educacional de crianças e jovens, sobretudo indígenas, negros e quilombolas, e a ausência da implementação de uma educação antirracista é um destes fatores.


Relacionado ao tema da redação, o ensino da história e cultura afro-brasileira é obrigatório

A Lei 10.639/2003 torna obrigatório o ensino da história e cultura africana e afro-brasileira no currículo escolar, mas, apesar da legislação, a maioria das instituições de ensino não proporciona esse tema aos estudantes. Para Ana Paula Brandão, os 22 anos da Lei têm colaborado para uma revisão histórica e a inclusão de outros olhares e percepções entre os profissionais de educação e, obviamente, os estudantes.

Segundo a profissional, o ensino da história e cultura africana e afro-brasileira nos currículos da educação básica, embora ainda longe do ideal, tem contribuído para a ampliação das políticas e estratégias pedagógicas de valorização da diversidade. 

“A inclusão desse tema no vestibular já deveria ter acontecido há muito tempo.Acredito que a inclusão do assunto vai impactar no ensino e na procura, por parte das escolas, de materiais e de formação continuada para seus professores, especialmente, na rede particular, onde a implementação da Lei ainda patina”, salienta. 

Por fim, Luciana Ribeiro defende que práticas pedagógicas antirracistas precisam estar acompanhadas de uma formação docente e de gestão, com o objetivo de o debate ser enfrentado de forma responsiva dentro da escola. 

“As Diretrizes Curriculares para Educação para as relações étnico-raciais (ERER) e o Plano Nacional para ERER trazem orientações para que isto ocorra. Neste sentido, entendemos que um outro passo importante para pensarmos práticas antirracistas no cotidiano escolar é por meio do conhecimento, ou seja, alterarmos as representações dos conteúdos que sempre apresentam histórias de conquistas e vitórias relacionadas a um grupo social que é o espelho da colonização e tem o branco como referência”, reforça a especialista.

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O racismo estrutural no Brasil tem dificultado, de forma sistêmica, o acesso ao direito a uma educação pública igualitária e de qualidade pelos estudantes negros, quilombolas e indígenas. A qualidade da educação que as crianças recebem no Brasil é profundamente segmentada por status racial e socioeconômico. E, hoje, identifica-se que as lacunas entre crianças brancas e crianças negras, quilombolas e indígenas, em todos os indicadores da educação básica, são persistentes e mais graves para jovens de 11 a 17 anos. Crianças e jovens negros, quilombolas e indígenas são os mais propensos a abandonar a escola, têm maiores taxas de exclusão e menor nível educacional. Portanto, a eles são destinados os empregos de menor prestígio e salários mais baixos quando adultos. Enquanto isso, os alunos brancos internalizam as desigualdades raciais a que são expostos nas escolas e as replicam quando adultos. Quando se observa os indicadores de aprendizagem, conclui-se também que não há apenas mais barreiras de acesso à escola para crianças negras, quilombolas e indígenas, mas, que uma vez na escola, essas crianças são menos propensas a acessar à educação de qualidade.

O Projeto SETA busca realizar ações transformadoras com base em evidências resultantes de estudos que ajudam a compreender a complexidade das relações raciais no país e as problemáticas delas decorrentes que precisam ser enfrentadas. Neste sentido, prevê uma série de estudos com recortes nacional e regionais em seus territórios de intervenção, especialmente no Amazonas, Maranhão, Rio de Janeiro e São Paulo. O objetivo é mapear a percepção da sociedade em geral, de profissionais da educação e estudantes sobre o racismo, as desigualdades raciais em geral e na educação, a efetividade das políticas de combate ao racismo, as lacunas de ferramentas e metodologias para fomento à equidade racial e as estratégicas bem-sucedidas e boas práticas nacionais e internacionais que podem inspirar ações de valorização da diversidade e das diferenças e de mitigação das desigualdades, especialmente na área de educação.

1) Pesquisa bianual de mapeamento de público sobre percepções do racismo pela sociedade brasileira.
2) Grupos focais bianuais sobre percepções do racismo pelas comunidades escolares.
3) Monitoramento e avaliação dos indicadores educacionais com análise dos indicadores da educação com foco em raça, gênero e território.
4) Estudos liderados pelas organizações que compõem o Projeto SETA sobre “educação escolar indígena”, “educação escolar quilombola”, “trajetória educacional de meninas negras”, “juventude negra, educação e violência”, “impacto da reforma do ensino médio no aprofundamento das desigualdades educacionais” e “construção participativa de indicadores e diagnóstico sobre qualidade na educação e relações raciais”.
Todas essas produções são/serão disponibilizadas publicamente para auxiliar a sociedade na construção de narrativas qualificadas, com base no retrato da realidade, em defesa da equidade racial na educação, além de orientar ações do projeto.

O PROJETO SETA – SISTEMA DE EDUCAÇÃO PARA UMA TRANSFORMAÇÃO ANTIRRACISTA É UM PROJETO APOIADO PELA FUNDAÇÃO W. K. KELLOGG, DESDE 2021, QUE REÚNE ORGANIZAÇÕES NACIONAIS E INTERNACIONAIS EM ATUAÇÃO CONJUNTA POR UMA EDUCAÇÃO PÚBLICA ANTIRRACISTA E DE QUALIDADE.